quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Diário de um ULTRA


Dou comigo a pensar várias vezes, o que ainda me prende à curva ao fim de estes anos todos, o que ainda me faz mover de Domigo para Domingo, inventar tempo que não disponho para cumprir com a promessa: "Sempre Presente".
Ainda me lembro bem de há alguns anos atrás, desfolhar a primeira Supertifo, tal como qualquer adolescente olha para uma revista de "Senhoras", e sentir um orgasmo visual. Do meu primeiro correspondente estrangeiro e da agonia que sentia nos dias em que as cartas não chegavam, do primeiro cachecol da colecção e das infindáveis fotografias espalhadas por tudo quanto é canto lá por casa. Dos amigos que fiz por todas as curvas deste país, e dos bons momentos que passamos juntos a trocar material e experiências, gostaria de inumerar a todos, um por um, mas entre amigos é assim, ficam os momentos no coração.
Nos últimos anos e talvez por culpa minha e de muitos outros ultras a "família" foi-se destruindo com a obsessão de cumprir melhor o objectivo a que nos propomos como ultras - apoiar incondicionalmente o clube do nosso coração.
O problema do movimento foi crescer sem estruturas organizadas e como um atleta dopado preocupamo-nos em ter mais elementos do que os outros grupos, em fazer as melhores coreografias e deslocações, ter na ponta da língua os cânticos da moda, não que tudo isto não seja importante porque o é, mas esquecemo-nos de transmitir a alma do movimento ou como gostamos de dizer entre nós, a MENTALIDADE!
Esquecemos-nos de que quem esta na curva em frente é alguém que pensa como nós, que apenas usa cores diferentes, esquecemos-nos que eles reforçam a nossa existência e sobretudo esquecemos-nos de aprender com os erros que ao longo destas duas décadas (fundamentalmente na data de fundação da mais antiga claque portuguesa) fomos comentendo.
Fomos assistindo à chegada de pseudo-ultras que nos foram impondo a sua linguagem de violência e roubos e fomos testemunhas da saída de grandes ultras das curvas por deixarem de pactuar com a atitude de muitos directores de grupos que não tomaram as devidas atitudes e penalizaram indivíduos estranhos ao movimento, chegando ao extremo de achar até piada e dar a verdadeira pancadinha nas costa como acto de reconhecimento, nós é que somos maus!!!
Preocupamos-nos em criticar a falta de atenção dos média para os nossos espectáculos e a falta de segurança nos estádios, o excesso das acções policiais, mas poucas ou nenhumas foram as vezes em que empreendemos uma acção conjunta que fosse para melhorar-mos a situação.
Falamos das revistas estrangeiras como verdadeiras bíblias mas poucas foram as vezes que compramos as que se fazem por cá, ou enviamos material sobre o grupo ou até uma pequena opinião que seja para a secção das cartas, deixando-as para os meninos que se deliciam a trocar "piropos" a tentar provar qual deles é realmente o mais estúpido.
Fomos pactuando com tudo isto, e o que recentemente aconteceu no Jamor (morte do adepto leonino) é a prova que os verdadeiros ultras se deixaram ultrapassar. O que me faz ainda cá andar, é acreditar no movimento, é partilhar a vontade de vencer cantando com o colectivo, é celebrar a amizade em cada tocha, é galgar a estrada e partilhar cada momento que se passa na curva, aqui reside a nossa mística, aqui esta a força do movimento ultra, aqui vivem os que infelizmente já não se encontram entre nós, aqui reside o "SEMPRE PRESENTES".

De novo e com mais força que nunca "SAUDAÇÕES ULTRAS"

Pipa
Revista SUPER ULTRA, Setembro de 1996

1 comentário:

  1. Tão antigo e tão atual , pena que já nao se façam fanzines desta qualidade multi-clubistica...

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